terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Die Zeit 1



"A vida é uns deveres que nós trouxemos para fazer em casa.
Quando se vê, já são 6 horas: há tempo…
Quando se vê, já é 6ª feira…
Quando se vê, passaram 60 anos…
Agora, é tarde demais para ser reprovado…
E se me dessem – um dia – uma outra oportunidade,
eu nem olhava o relógio.
seguia sempre, sempre em frente …

E iria jogando pelo caminho a casca dourada e inútil das horas."

Mário Quintana, "Seiscentos e sessenta e seis", in http://www.poesiaspoemaseversos.com.br/mario-quintana-poemas/

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Geheimnisse meiner Seele




"Não me inquieto
quando não recebo as respostas
das perguntas que não fiz.
Eu me conformei
em reservar alguma coisa
de ti para saber depois.
Um pouco de nosso amor
será póstumo.
É recomendável
não descobrir todos os segredos."

Fabrício Carpinejar, in http://casadospoetas.blogs.sapo.pt/80116.html

sábado, 21 de janeiro de 2012

Mein Wunsch, sonst nichts!



"Para a minha alma eu queria uma torre como esta,
assim alta,
assim de névoa acompanhando o rio.

Estou tão longe da margem que as pessoas passam
e as luzes se reflectem na água.

E, contudo, a margem não pertence ao rio
nem o rio está em mim como a torre estaria
se eu a soubesse ter...
                                    uma luz desce o rio
                                    gente passa e não sabe
que eu quero uma torre tão alta que as aves não passem
                                                              as nuvens não passem
                                                              tão alta tão alta
que a solidão possa tornar-se humana."



Jorge de Sena, Antologia Poética, Lisboa: Edições Asa, 2001, p. 45

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Für ein lieber Freund




"Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.


Meto as mãos nas algibeiras
e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro!
Era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.


Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes!
e eu acreditava.
Acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.
Mas isso era no tempo dos segredos,
no tempo em que o teu corpo era um aquário,
no tempo em que os meus olhos
eram peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco, mas é verdade,
uns olhos como todos os outros.


Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor...,
já se não passa absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.


Não temos já nada para dar.

Dentro de ti
não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.


Adeus."

Eugénio de Andrade, Primeiros Poemas, As Mãos e os Frutos, Os Amantes Sem Dinheiro, Porto: Fundação Eugénio de Andrade, 2000, pp. 94-5

segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Ich friere...


"Tenho frio.
E os teus braços não estão aqui
Para me aquecerem."

Paulo Eduardo Campos, in «Na serenidade dos rios que enlouquecem», Amores Perfeitos, Vila Nova de Famalicão, 2005 (http://nescritas.com/poetasapaixonados/listapoesiasdeamor2/1992/10/)

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Beichte 1



Talvez não seja próprio vir aqui dizer que te amo. No mundo, há mais uma pessoa que ama. Qual a relevância dessa notícia?
Eu sei. Talvez não seja próprio vir aqui dizer aquilo que, de modo mais ecológico, te posso afirmar ao vivo, por email, por comentário do facebook ou mensagem de telemóvel, mas é tão bom acreditar, transporta tanta paz. Tu sabes. Extasio-me perante este agora e deixo que a sua imensidão me transcenda, não a tento contrariar ou reduzir a qualquer coisa explicável, que tenha cabimento nas palavras, nestas pobres palavras. Em vez disso, desfruto-a, sorrio-lhe. Não estou aqui com a expectativa de ser entendida. Eu própria procuro ainda essa compreensão. Estou aqui apenas com o meu rosto, o meu olhar parado, a minha figura. Tudo aquilo que tenho para dizer está por detrás dessa imagem. Hoje, esse é o alfabeto com que realmente escrevo, o significado. Escrevo também com uma grande quantidade de elementos invisíveis, que chegam à pele e a atravessam. É dessa forma que sinto aquilo que tenho para dizer, pele e para lá da pele.
Talvez não seja próprio dizê-lo aqui, mas talvez seja ainda menos próprio escrevê-lo em todas as paredes da cidade, esculpir precipícios com essa verdade ou rasgar o peito com uma faca e, com a ponta dessa mesma faca, gravá-lo dentro de mim, em sulcos profundos, com o tamanho deste agora.

José Luís Peixoto, 'Abraço' in http://www.citador.pt/textos/amote-jose-luis-peixoto (texto com supressões e alterações)

domingo, 8 de janeiro de 2012

Lieber Freund 4



"Outra vez imperfeita,
conjugada ao de leve em alegria,
falar-te-ia da perfeição dos ramos,
e não serias ramo imaginado,
mas árvores de folhas, seiva, lume.

Por ti morro. Ou por mim?
E agora vejo o que antes só sonhara:
que amar-te é estar em mim.
E para sempre será o meu silêncio,
e quase em fim
o fio se desmanchou."

Ana Luísa Amaral, "Próspero morre. Poema em acto", Editorial Caminho, 2011, p. 47

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Das weiss ich ganz genau!



"du guckst mich an
und ich geh mit
und der ist ewig dieser augenblick
da scheint die sonne
da lacht das leben
da geht mein herz auf
ich will's dir geben
ich will dich tragen
ich will dich lieben
denn die liebe ist geblieben
hat nicht gefragt
ist einfach da
weglaufen geht nicht
das ist mir klar

du und ich das ist ganz sicher
wie ein schöner tiefer rausch
von der ganz besonderen sorte
und wir haben ein recht darauf
uns immer wieder zu begegnen
immer wieder anzusehen
wenn die große weite welt ruft
werd ich sicher mit dir geh'n

liebe will nicht
liebe kämpft nicht
liebe wird nicht
liebe ist
liebe sucht nicht
liebe fragt nicht
liebe ist so wie du bist

gute nacht mein wunderschöner
und ich möcht mich noch bedanken
was du getan hast
was du gesagt hast
es war ganz sicher nicht leicht für dich
du denkst an mich in voller liebe
und was du siehst geht nur nach vorne
du bist mutig
du bist schlau
und ich werd' immer für dich da sein
das weiß ich ganz genau

du und ich wir sind wie kinder
die sich lieben wie sie sind
die nicht lügen und nicht fragen
wenn es nichts zu fragen gibt
wir sind zwei und wir sind eins
und wir sehn die dinge klar
und wenn einer von uns gehen muss
sind wir trotzdem immer da

(...)"

Nena, "Liebe ist", in http://www.magistrix.de/lyrics/Nena/Liebe-Ist-24077.html

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

Gibt es solche Tage?


(Um pormenor do quadro "The Tree of Life" de Gustav Klimt)


"Se tens por vezes desses dias
em que as montanhas se confundem
ou com neve que as oprime
ou com nuvens que as circundam

também eu tenho desses dias
em que as montanhas me seduzem
desde que a neve as não agrida
nem vogue em torno de uma só nuvem

Mas temos ambos outros dias
em que as montanhas são de lume
É quando a neve se expatria
mesmo que as nuvens não sucumbam"

David Mourão-Ferreira, "Obra Poética 1948-1988", Lisboa: Editorial Presença, 1996, p. 355.


domingo, 1 de janeiro de 2012

Einladung zum Anfang des Jahres!



"Então vem, vamos juntos os dois (...)

Haverá por certo um tempo
Para o fumo amarelo que desliza pela rua
E esfrega as costas nas vidraças;
Haverá um tempo, tempo
De compor um rosto para olhares os rostos que te olharem;
Tempo de matar, tempo de criar,
E tempo para todos os trabalhos e os dias, de mãos
Que se erguem e te deixam cair no prato uma pergunta;
Tempo para ti e tempo para mim,
E tempo ainda para cem indecisões
E outras tantas visões e revisões
Antes de tomar o chá e a torrada. (...)


Ficámos nas mansões do mar nós dois em abandono
Entre as ondinas com grinaldas de algas castanhas purpurinas
Até que vozes humanas nos despertam e morremos naufragados."


T. S. Eliot, "A canção de Amor de J. Alfred Prufrock", Lisboa: Assírio & Alvim, 1993, pp. 19-31.