"Que dizer destas sombrasencostadas na noite às árvores e à névoa?
Que dizer-lhes de nós,
se as vemos como que iniciar
uma conversa todavia nossa?
Que algures no mundo ou junto delas
os amantes se tocam, se procuram?
Que a morte continua, como os homens,
a matar? Que as guerras e os massacres
prosseguem incontáveis? Que crianças
continuam a nascer em gritos de surpresa?
Que as folhas caem, hervas reverdecem,
o vento sopra às vezes, e que o sol
brilha no que, movendo-se, ou quieto,
não possa recusar-se a reflecti-lo?
E que sombras ilusórias, pressupostas,
sonhando entre o arvoredo o que não sabem
ser tão diverso e tão igual, não contam
entre o que existe e não existe? O que
dizer-lhes ou dizer? Só isto, ou nada?"
Jorge de Sena, Poesia III, Lisboa: Edições 70,1989, pp. 134-135
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