“O vosso amigo é o vosso desejo cumprido. É o vosso campo que semeais com amor
e colheis com gratidão. É a vossa mesa servida e o vosso átrio. Apresentais-vos
a ele com a vossa fome e nele procurais a paz. Quando o vosso amigo vos diz o
que pensa, não receeis o “não” do vosso espírito, nem retenhais o “sim”. E
quando estiver silencioso, não deixe o vosso coração de escutar o seu coração;
porque na amizade, todas as ideias, todos os desejos e todas as esperanças
nasceram e foram partilhadas sem palavras e com uma alegria inexprimível. Quando
vos separardes do vosso amigo, não vos entristeçais, porque aquilo que de melhor
amais nele pode tornar-se mais claro na sua ausência; tal como vista da
planície, a montanha é mais nítida para quem a escala. E que não haja outro fim
na amizade que não seja o aprofundar da alma. Porque o amor que não procura
revelar o seu próprio mistério não é amor, mas sim uma rede lançada a um mar sem
peixes, apenas conseguindo prender o supérfluo. E que o melhor que haja em vós
seja para o vosso amigo. E se ele tiver que conhecer o refluxo da vossa maré,
que conheça também o seu fluxo. Pois, para que serve o amigo se o procurais
apenas para matar o tempo? Procurai-o sempre para as horas vivas. Ele vem para
resolver as vossas necessidades, mas não o vosso vazio. E que na doçura da
amizade residam a alegria e a partilha dos prazeres. Porque é no orvalho das
coisas pequenas que o coração encontra a sua manhã e se reanima.”
Kahlil Gibran, O Profeta, Mem Martins: Livros de Vida Editores, 2003: 58-9
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