quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Nur heute, bitte!



"Não me peçam hoje lágrimas para aquele que morreu
E pensou.
Não me aluguem o dó, que não está disponível.
Nem me peçam que no sangue do que só acreditou
e morreu,
eu beba aquela coragem que sinceramente não tenho.
Fé por fé basta-me esta de acreditar hoje, só hoje,
que afinal não vale a pena.
Amanhã talvez esqueça 
ou perdoe.
Mas por hoje, céus, emprestai-me 
essas tubas dos arcanjos do fim do mundo
ou a trombeta castelhana d' Os Lusíadas,
ou qualquer coisa que berre.
Não tenho ideias a dizer,
nem sonhos, nem ódios, nem promessas.
Tenho só um grito, mas um grito longo,
horrendo, fero, ingente e temeroso
que me diz todo
por hoje,
só por hoje."

                                                  Vergílio Ferreira, Diário Inédito, Lisboa: Bertrand Editora, 2008 , p. 140

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