"mas ela queria a vivência, a qualquer preço, procurava uma visão desmedida das coisas, e por isso sofria, porque toda a consciência era dolorosa. Ir sempre mais além, como um animal caminhando obsinadamente pela areia, um pequeno animal cego avançando, recusando cada ponto de chegada para nunca parar de caminhar, era isso, (...) ele sabia, a ansiedade que a levava a recusar a sua vida, a vida possível, na pressa de procurar outra, mais alta mas inexistente, (...) ele sabia - a sua inteligência aguda atravessando a casa, o seu corpo afiado, magro, embatendo nas pessoas e nas coisas, magoando quem lhe tocava, incomodando com a sua temperatura demasiado alta, uma nota estridente, uma voz solta, que sempre de novo nega o seu contexto, era preciso pegar-lhe pelos ombros e prendê-la no real, ou ela acabaria por perder-se em confusos caminhos (...)"
Teolinda Gersão, O silêncio, Lisboa: Sextante Editora, 5ª edição, 2007, p. 82-3
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