"O mundo antigo, em particular o mundo greco-romano, não acreditava nos ideais abstractos, longínquos e irrealizáveis. Suspeitava dos fantasmas. Desconfiava dos excessos sentimentais. Por isso dava tanta importância à amizade. Porque, na amizade, a distância entre o ideal e o real deve ser breve. Na amizade não podemos proclamar uma coisa e fazer outra. Na amizade os pactos são respeitados, a lealdade merecida. A amizade deve ser leal, sincera, límpida. O amigo deve querer o bem do amigo, não por palavras, mas concretamente. Deve estar presente no momento da necessidade. Aquele que é beneficiado não se deve nem aproveitar nem aborrecer com as ingratidões. Na amizade não se pode enganar, não se pode fazer mal. Nem mesmo uma única vez. Na amizade é necessário saber ver a virtude do outro e dar-lhe valor. O amigo deve ser aberto, cheio de vida, divertido. Não deve aborrecer, não deve importunar. Um amigo não deve também ser demasiado generoso, encher de presentes, porque se o faz suscita a necessidade de retribuir, cria deveres de reconhecimento que são demasiado pesados. A amizade deve ser sempre fresca, ligeira, mesmo quando é heróica. A amizade diz sempre, mesmo perante a morte: «Não tem de quê.» Estes são os ideais da amizade. Não pede para dar tudo, beijar os leprosos, mentir em tribunal. Nem mesmo para viver sob o mesmo tecto. Mas o que pede exige-o. E, se não lhe é dado, julga e condena. Um vez condenado, bem dificilmente perdoa. Não pune, não ameaça, não exerce represálias, não se vinga. Simplesmente desaparece. Se o ideal não é realizado, a amizade morre."
Francesco Alberoni, "A Amizade", Venda Nova: Bertrand Editora, 1996, pp. 195-6
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