"Através dos seus grandes defeitos - que um dia ela pudesse mencionar sem se vangloriar - é que chegara agora a poder amar. (...) Talvez fossem os seus «apesar de» que, cheios de angústia e desentendimento de si própria, a estivessem levando a construir pouco a pouco uma vida. (...)Era cruel o que fazia consigo própria: aproveitar que estava em carne viva para se conhecer melhor, já que a ferida estava aberta. Mas doía de mais mexer-se nesse sentido. Então preferiu apaziguar-se e planejou que, no táxi, pensaria no nariz recto de Ulisses, na sua cara marcada pela aprendizagem lenta da vida, nos lábios que ela jamais beijara.
Só que ela não queria ir de mãos vazias. E assim como se lhe levasse uma flor, ela escreveu num papel algumas palavras que lhe dessem prazer (...)."
Clarice Lispector, Uma Aprendizagem ou o Livro dos Prazeres", Lisboa: Relógio D' Água, 1999, p. 23-4