sábado, 31 de dezembro de 2016

Versprechung





"Prometi a mim mesmo três coisas neste dia. Conhecer a origem em mim desta frustração. Nunca mais gritar (...). Perdoar-me sempre que for preciso porque o amor não vem nos livros. É a vivência que o manifesta e o corrige."

Pedro Fernandes, "Como lidar com as birras" in http://pedrofernandes.com.pt/

Treppenstufe





"uma frescura é que me molhou a pele, conheço bem a zona e nunca tinha sentido essa frescura, vi uns degraus partidos e pensei que era melhor não pisar, saltei, subi mais, as conchas do meu saco faziam mais barulho, só que meu coração me dizia pra subir, continuei"

Ondjaki, Os transparentes, Alfragide: Caminho, 2012,  P. 269

quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

Lebenserinnerungen 3






"Naquela tarde quebrada
contra o meu ouvido atento
eu soube que a missão das folhas 
é definir o vento"

Ruy Belo, "A missão das folhas", in Todos os Poemas, Lisboa: Assírio & Alvim, 2000, p. 71

Lebenserinnerungen 2





"Aí estás tu à esquina das palavras de sempre
amor inventado numa indústria de lábios
que mordem o tempo sempre cá
E o coração acontece-nos
como uma dádiva de folhas nupciais
nos nossos ombros de outono
Caiam agora pálpebras que cerrem
o sacrifício que em nossos gestos há
de sermos diários por fora
Caiam agora que o amor chegou"


Ruy Belo, "Acontecimento", in Todos os Poemas, Lisboa: Assírio & Alvim, 2000, p. 41

Lebenserinnerungen 1





"ó memória, inimiga mortal do meu descanso"

Ruy Belo, "Prince Caspian", in Todos os Poemas, Lisboa: Assírio & Alvim, 2000, p. 111


segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

Der Triumph der Zeit





"Rápida, viva e silenciosa como um sonho,
Mergulha, cansada do sol e da chuva: 
Nenhum vento é rude para as flores luxuriantes e raras;
O mar tão suave, fonte dos amores e das horas,
Estremece e cintila sobre o brilho dos ventos pálidos
Tornando o seu sorriso numa dor fugitiva."

A. C. Swinburne, Poemas, Relógio D' Água, 2005, p.  73

sábado, 24 de dezembro de 2016

Meine Weihnachtskrippe





"O meu Presépio não tem Estrela
nem pastores
nem Reis Magos
e não há musgos verdes e macios
sobre a rocha da gruta.
O meu Presépio não tem  flores de papel
nem bonecos de barro
nem casinhas de cartolina.
E não há espelhos a fazer de lagos
nem farinha branca a traçar caminhos.
O meu Presépio não tem luzes de mil cores
nem Anjo de asas de renda
nem um Menino Jesus a sorrir para mim.
Assim era outrora
o meu Presépio na sala toda iluminada
no tempo em que eu usava bibe cor-de-rosa
e duas traças morenas.
O meu Presépio 
agora
tem o tamanho do mundo inteiro
e não tem luzes de mil cores
nem estrelas no azul
e não há bonecos de barro
nem anjos de asas de renda,
mas há noites de angústia
e manhãs sem esperança
em casas feitas de lata, 
em casas feitas de caniço.
E há crianças sujas
com um sorriso triste
que me faz doer.
Pudesses voltar!,
Menino Jesus do meu Presépio de criança."


Leonilda Alfarrobinha, Poema de Natal, in "de natal em busca", Ed. Pássaro de Fogo, 2006, pp. 65-6

An solchen Tagen...





"há dias assim
dias de uma profunda claridade
nos saindo da alma
para atravessar os desertos escuros
(e sorver-lhes a água)
até às portas do infinito

há dias em que saímos de casa
(para o choque brutal da última estrela)
e a ela regressamos
de olhos cansados
mas certos do fogo
nos sulcando
dentro"

Alexandra Duarte, há dias assim, in "de natal em busca", Ed. Pássaro de Fogo, 2006, p. 126

sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

Viele Tage sind vergangen, JM!






"São muitos dias
(e alguns nem tantos como isso...)
e começa a fazer-se tarde de um modo
menos literário do que soía, 
(um modo literal e inerte
que, no entanto, não posso dizer-te
senão literariamente).
Mas não há pressa, nem se vê ninguém a correr;
a única coisa que corre é o tempo,
do lado de fora, porque dentro
a própria morte é uma maneira de dizer.
Caem co'a calma as palavras
que sustentaram o mundo,
e nem por isso o mundo parece
menos terreno ou impermanece.
Restam, é certo, alguns livros,
algumas memórias, algum sentido,
mas tudo se passou noutro sítio
com outras pessoas e o que foi dito
chega aqui apenas como um vago ruído 
de vozes alheias, cheias de som e de fúria:
literatura, tornou-se tudo literatura!
E a vida? (Falo de uma vida
muda de palavras e de dias, uma vida nada mais que vida;
haverá uma vida assim para viver,
uma vida sem a si mesma se saber?)
Lembras-te dos nossos sonhos? Então
precisávamos (lembras-te?) de uma grande razão.
Agora uma pequena razão chegaria,
um ponto fixo, uma esperança, uma medida."


Manuel António Pina, "Quinquagésimo ano", in Atropelamento e Fuga , Porto: Edições Asa, 2001, pp. 16-17

quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

Wörter



"Pouca coisa são as palavras. No entanto é o que tenho, palavras. E memórias, também elas feitas e desfeitas de palavras."

Manuel António Pina, "A noite unânime", in Crónica, saudade da literatura, Lisboa: Assírio & Alvim, 2013, p. 183

quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Fehlerhafte Berechnung





"Porque eu fazia do amor um cálculo matemático errado: pensava que, somando as incompreensões, é que se ama verdadeiramente. Porque eu, só por ter tido carinho, pensei que amar é fácil.É porque eu não quis o amor solene, sem compreender que a solenidade ritualizava a incompreensão e a transforma em oferenda. E é também porque fui sempre de brigar muito, meu modo é brigando. É porque sempre tento chegar pelo meu modo. É porque ainda não sei ceder. É porque no fundo eu quero amar o que eu amaria - e não o que é. É porque ainda não sou eu mesma, e então o castigo é amar um mundo que não é ele. É também porque eu me ofendo à toa."

Clarice Lispector, "Perdoando Deus", in A Descoberta do Mundo , Lisboa: Indícios de Ouro, 2004, p.  331

Verträumtheit





"Lutei toda a minha vida contra a tendência ao devaneio, sempre sem jamais deixar que ele me levasse até as últimas águas. Mas o esforço de nadar contra a doce corrente tira parte da minha força vital. E, se lutando contra o devaneio, gano no domínio da ação, perco interiormente uma coisa muito suave de se ser e que nada substitui. Mas um dia ainda hei de ir, sem me importar para onde o ir me levará."

Clarice Lispector, "Ir contra uma maré", in A Descoberta do Mundo , Lisboa: Indícios de Ouro, 2004, p. 403

Das Leben und der Tod





"A perecibilidade das coisas e dos entes. Mas a perecibilidade das coisas existentes, sendo substituída por outras perecíveis que são substituídas pela perecibilidade de outras - a essa constância se pode, querendo, chamar de perecibilidade eterna: que é a eternidade ao alcance de nós. Mas Lavoisier explicou melhor."

Clarice Lispector, "Lavoisier explicou melhor", in A Descoberta do Mundo , Lisboa: Indícios de Ouro, 2004, p. 629